Meu olho seco passeia pela casa e eu vejo a parede verde e penso em coisas terríveis. Lá fora o barulho da rua e das pessoas parecem um tipo de canto estrangeiro. As vezes fico horas na janela olhando pros homens que trabalham e tento entender como se faz pra suportar a coisa toda. Eles parecem em paz com seus martelos e capacetes. Parecem prontos pra qualquer coisa. Não parecem gente, parecem outra coisa.
A moça que eu olho não me vê e eu adoro olhar sem ser visto. Eu sou o espião dela. Eu cuido dela e ela nem imagina que pode contar comigo. Naquela foto que eu vi um dia ela parecia estar muito feliz, embora fizesse força para parecer triste. É isso que eu penso enquanto reparo em tudo que ela faz. É tudo sobre ela, mas ela insiste em ser sonsa e não me topar de frente.
Em casa tem um rádio tocando e também um monte de arquivos abertos no computador. Arquivos de sonhos escritos que me alimentam e envenenam, pendendo mais pra um dos lados de acordo com o dia. Dia sim, dia não é o que sempre imagino. São as pequenas defesas que eu crio pra acreditar nas minha próprias mentiras. É uma maneira de viver.
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