domingo, abril 23, 2006

Texto do Bortolotto.

VAI COLADO UM TEXTO DO MÁRIO BORTOLOTTO. BELO TEXTO POR SINAL. É BOM LER ESSA COISA NESSE MOMENTO. É, DE CERTA FORMA, UMA ÓTIMA MANEIRA DE SE ENTENDER O AMOR. SEI LÁ.


Meu amigo Picanha costuma bradar sempre que está bêbado “Tenho oito casamentos e nenhum funeral”. Estou no meu terceiro casamento. Meio esquisito isso. Principalmente porque sou um cara que não acredita em casamentos. Mas eu acredito em contradição, então acho que tá explicado, né? Minha primeira mulher era uma garotinha linda de 16 anos (eu tinha 22). Ela havia acabado de entrar na faculdade de Jornalismo. Ela me levava pra comer cheese-salada e eu costumava tirar as ervilhas do meu sanduíche e dar pra ela. A gente se sentava em cima do telhado de casa e ficava chupando manga enquanto “Rain Dogs” tocava sem parar lá embaixo. À noite a gente deitava no colchão velho no chão e ela me abraçava assustada com medo das ratazanas que costumavam andar sobre as vigas do meu quarto. Minha segunda mulher era uma garota linda professora de literatura que me levava bêbado até sua casa e me preparava um prato de comida de madrugada. Ela misturava tudo o que encontrava nas panelas da mãe dela, esquentava e me preparava um prato. Depois ela me emprestava sua bicicleta e eu ia embora de madrugada pedalando e levemente feliz. Minha segunda mulher me deu minha menina. E hoje minha menina tem 14 anos, e essa eu sei que é pra sempre, graças a Deus.

Minha terceira mulher é também uma mulher linda e tem os olhos verdes mais fudidos de bonitos que eu já vi. A primeira coisa que eu notei foram aqueles olhões verdes fixos em mim naquele bar em São José do Rio Preto há exatos 17 anos atrás. E hoje ela tá fazendo aniversário e não vai comemorar porque seus belos olhos verdes estão com problemas. Ela tá tratando e eu sei que vai ficar tudo bem. Ela anda um pouco triste e eu tento não ser o cara mais insuportável do mundo pra não piorar ainda mais as coisas. Eu sei que nem sempre consigo, mas eu me esforço. Minha terceira mulher prepara carne moída com arroz nos domingos que eu como com sofreguidão e gula, depois a gente deita no sofá e fica assistindo “Nova York contra o Crime”. Lá fora o mundo faz um bocado de barulho, mas a gente não tá nem aí. Acho que Deus reserva abrigos antibombas para imprudentes como eu. Às vezes a gente anda torto por aí e nem percebe que eles estão ao alcance de nossos olhos. E dos nossos corpos cansados. E eles nem custam tão caro assim.